quinta-feira, 1 de outubro de 2009

HONDURAS em cheque

Como o golpe de estado do país latino-americano mobilizou o Brasil e o mundo

Eram 5h30min do dia 28 de junho. Manuel Zelaya dormia em sua casa em uma pequena rua de Honduras. Foi nesse momento que as tropas militares do país invadiram a sua residência, portando armas e máscaras. O até então presidente hondurenho foi forçado a abandonar sua nação, de pijamas, deixando para trás o chapéu e as botas que compõem sua personalidade, rumo a Costa Rica.

O conflito latino-americano que tem tomado conta das páginas dos jornais brasileiros não se trata apenas da volta do presidente deposto ao país. Tudo começou em março, quando Zelaya convocou um referendo sobre reforma constitucional para permitir a sua disputa a um segundo mandato nas eleições presidenciais de 29 de novembro. A ação causou desgosto aos políticos e a população hondurenha que chegou a ir às ruas para protestar. Pouco depois, em junho, o Congresso aprovou uma lei proibindo consultas populares seis meses antes ou depois das eleições gerais.

Porém, a determinação de Zelaya foi mais forte e no momento em que o comandante militar, general Romeo Vásquez, se recusou a instalar as urnas para o referendo, sua atitude foi de destituir o militar. A bola de neve foi crescendo e dias depois do último conflito, o golpe tomou conta do país. Roberto Micheletti, descendente de italianos e político a mais de 30 anos, assumiu a presidência exilando o presidente deposto e impedindo seu retorno ao país.

Foram duas as tentativas falhas de retorno a Honduras, ambas ainda em julho. Zelaya só conseguiu efetivar seu retorno com o apoio do presidente da Venezuela, Hugo Chávez, e autoridades da Nicarágua. Mas esta ação colocou a política externa brasileira em risco. Na última segunda-feira (21), o presidente deposto surpreendeu a todos ao aparecer na embaixada brasileira em Honduras. À porta número 3.201 da Calle República del Brasil, onde fica a embaixada, apenas um segurança presenciou a chegada do político e seus simpatizantes.

O governo brasileiro mostrou não estar ciente do esquema traçado por Chávez. Na opinião de Rubens Barbosa, ex-embaixador do Brasil, na Inglaterra e nos Estados Unidos, esse é um risco que Luis Inácio “Lula” da Silva não precisava correr. “Admitindo que ele não soubesse da articulação para o retorno de Zelaya, não tinha nenhuma razão para se envolver no problema. Poderia ter negociado para que ele fosse para outra embaixada, como a do México, país mais próximo a Honduras do que o Brasil”, afirma Barbosa.

O conflito se tornou diplomático. A embaixada foi cercada por centenas de militantes a favor da volta do ex-presidente ao poder. Zelaya aproveitou a oportunidade para improvisar um comício e falar pela primeira vez ao povo hondurenho desde que fora afastado da Presidência. Ato que contrariou o governo interino, que ameaçou invadir o prédio e atacou manifestantes com bombas de gás lacrimogêneo e jatos d’água. Pela primeira vez na história, a soberania brasileira se viu ataca e desrespeitada desta maneira. Cerca de 300 pessoas invadiram a instituição, provocando a morte de dois civis.

A sede, que agora se encontra sitiada, tem como único diplomata Francisco Catunda. Água, energia elétrica e telefone chegaram a ser cortados na terça-feira (22). Por causa do isolamento, os alimentos tiveram que ser fornecidos com a ajuda das missões diplomáticas da vizinhança. A presença de Zelaya no território brasileiro jogou o governo Lula no epicentro de uma crise internacional.

Lula aproveitou sua ida aos Estados Unidos, na 64ª Assembleia-Geral da Organização das Nações Unidas (ONU), para se pronunciar sobre o fato: “A comunidade internacional exige que Zelaya reassuma imediatamente a Presidência e deve estar atenta à inviolabilidade da missão diplomática brasileira em Tegucigalpa”. Já o analista político Carlos Cordero, da Universidade Mayor de San Andrés, na Bolívia, achou correta a decisão do presidente brasileiro. “Pode parecer que o Brasil apoia Zelaya, mas o que o governo Lula está tentando é defender os princípios democráticos e não perder o protagonismo na América Latina ante o avanço da política externa venezuelana”.

E não é a toa que a participação efetiva do Brasil no episódio seja o capítulo mais debatido desta história. Para o governo golpista, o Brasil está se intrometendo nos assuntos internos hondurenhos. Ciente da gravidade da situação, Lula tentou angariar o apoio de outros chefes de Estado para uma solução negociada do emblema. O Conselho de Segurança da ONU condenou o cerco à embaixada e exigiu que ele fosse interrompido na sexta-feira (25).

A situação foi controlada pela diplomacia brasileira, com o apoio da ONU e da Organização dos Estados Americanos (OEA). E Zelaya está mais contido, usando a infra-estrutura da embaixada como um escritório político, mas sem incitar a população. A nova pauta são as eleições marcadas para o dia 29 de novembro, cujo resultado pode não ser reconhecido pela OEA se a crise persistir.

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