quarta-feira, 4 de fevereiro de 2015

Identidade de viagem - PARTE 1

Fazer intercâmbio significa ir muito além da mudança física. Ao me inserir neste contexto, eu pude reparar como somos frágeis e influenciáveis seres humanos. Dias antes de viajar, uma viagem que ainda não tinha confirmações, pois meu visto estava sendo processado, até o último minuto, eu iniciei um processo espiritual de preparação para o embarque. Não, não é medo de avião. É que eu me dei conta, ao fazer as malas, que ir para outro país nos exige uma cultura, uma identidade local que será esperada com bastante expectativa do outro lado do mundo. Foi neste momento, que eu descobri que eu não tinha pátria, nunca fui brasileira, não tinha camiseta nem bandeira para ostentar meu nacionalismo, não tinha nada que representasse meu Estado, exceto por uma cuia de chimarrão.

Para construir-se é preciso matar-se sem morrer, e eu passei a última semana em crise existencial, jogando fora partes de uma personagem, que sai de cena, e adquirindo peças para montar uma nova pessoa. Não é tarefa simples, principalmente quando somos conscientes do feito. Viajar é mudar a cada segundo, é levar o mundo nas costas, estar no ponto de chegada e perceber que não se é mais dono de nada e que por alguns dias você não existe em cadastro ou sistema nenhum. É não ter com quem chorar e rir, é saber que há um vazio, mas um vazio proposital para que novas memórias e laços de afeto sejam criados.

A saída é um desprendimento que se dá aos pouco, cada documento feito, cada coisa que vai encontrando seu lugar e significando mais um dia riscado no calendário. São dias sem dormir e preocupações com as coisas mais inúteis. Chegar também não é fácil. Há uma nova família te esperando, de amigos, de relações ainda frescas e por moldar. Eu cheguei em uma casa onde tudo literalmente está por ser construído, da cama aos laços, tudo precisa de muito trabalho. Essas coisas dão vontade de desistir, até que você a oportunidade que a vida te da de usar isso em benefício próprio. Afinal, fazendo que se aprende.

Como lidar com aquela sensação de não pertencer quando você pisa num país xenofóbico e em forte crise econômica e sente que é aqui que você deve passar o resto da vida? Ainda não sei ao certo. Apesar da construção gaúcho-brasileira, me sinto mais europeia cada dia que passa. Defendo esta terra como meu lar, mesmo ainda não tendo estabelecido isto aqui. Há saudades, mas também existe uma nostalgia do que eu ainda nem vivi aqui.

Não posso negar, tive sorte. Encontrei amor em terras lusitanas, ou quase isso. Não importa onde a gente vá, sempre buscamos algo ou alguém que nos dê força para seguir em frente e levantar da cama todos os dias. E eu tinha esquecido como podia mesmo ser boa essa letargia da paixão. Como amar pode nos fazer bem, se a gente deixar o medo de lado. Tarefa difícil a parte, quando a gente consegue, tudo fica mais bonito, mais leve, mais fácil. E é isso aí, minha gente, agora é só sorrisos.

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