O que Ismail Xavier vem a chamar de cinema moderno, em seu livro Cinema Brasileiro Mordeno (Editora Paz e Terra, R$10,00), nada mais é do que o estilo surgido nos anos 60 que visava debater aquilo que era nacional-popular. Paralelo ao cinema europeu e latino-americano, o recém nascido cinema brasileiro caminhava na direção da problemática do realismo, da militância política e da questão da identidade. Cinema este que estabeleceu diálogo com a literatura nacional e levou ao público grandes obras como, Os Sertões de Euclides da Cunha que virou tema central do filme Deus e o Diabo na Terra do Sol, de Glauber Rocha.
O Cinema Novo engajou-se na política e foi muito estimulado por movimentos culturais do país e de toda a América Latina. Tornou-se crítico e assimilou o espírito do radicalismo dos anos 60. Segundo Xavier, o modernismo dos anos 20 foi uma das inspirações para tais acontecimentos. Neste momento da história que se criou a matriz decisiva da articulação entre nacionalismo cultural e experimentação estática, fatores absorvidos e retrabalhados pelo Cinema Novo. Alguns filmes de autor resultaram e complexos demasiado exagerados, uma vez que se buscava uma arte pedagógica. Então, o cinema de autor ganhou uma feição particular.
Mas aos poucos surgiram desafios aos cineastas. Foi preciso questionar a burocracia da produção e o mito da técnica em nome da liberdade de criação e na incisão da atualidade. Xavier relata que neste momento da história levantou-se a discussão sobre os imperativos de mercado e os problemas de morte ou continuidade do cinema. A estética da fome visava enfrentar o golpe levando a atualidade, o engajamento ideológico e uma linguagem adequada às condições precárias, capaz de exprimir uma visão crítica da experiência social, às telas brasileiras. Já nos anos 80, houve ou adaptação no modo com o qual se produziam os filmes, resultando em um rompimento com a estética da fome e afirmando a técnica e a mentalidade profissional.
Entre 1969 e 1973, imperou no país o Cinema do Lixo, nomeado de marginal algumas vezes, que se traduz em uma postura agressiva, violenta, mas com humor retratando o momento infernal vivido no país. Este cinema foi alvo da censura, era mais ousado no sexo do que o Cinema Novo, tratava mais especificamente do lazer paulista na baixada Santista. Outro ponto de destaque é que este estilo também era uma forma de recusar a reconciliação com os valores de produção dominantes no mercado.
Mais tarde veio a necessidade de afirmar valores, iluminar experiências históricas, rever o passado e trazer pra dentro do cinema a mulher, o negro, o índio, a comunidade religiosa, o burguês nacionalista, todos os que de alguma maneira eram alvo de problemas sociais. A preocupação passou a ser o cinema da voz do outro, defender a diferença e impor sentido às vivências. Para concluir o livro, o autor faz um ensaio sobre Glauber Rocha, toda sua filmografia e sua importância não só para o cinema, mas também para a história do Brasil.